É difícil acreditar que uma pessoa que não apresente sintomas esteja doente. Mas para os hipertensos isso é possível. Para evitar que o mal continue a atingir silenciosamente trabalhadores em canteiros de obras, desde 2004 o Serviço Social da Indústria da Construção Civil de Minas Gerais (Seconci-MG) promove palestras educativas nas construtoras. O sucesso é tanto que o tema, entre os muitos oferecidos pela instituição, é o mais requisitado pelas empresas. Segundo dados do Seconci-MG, até hoje já foram feitas mais de cinco mil medições de pressão em trabalhadores de idade variada, das áreas administrativa e operacional. Há 40 dias, o pedreiro da Construtora Caparaó, Cícero Alves dos Santos, 49 anos, filho de pais hipertensos, descobriu que nele também se manifestava a doença dos seus parentes. Ele identificou a pressão alta quando participava de um programa da construtora, que estimula a qualidade de vida no trabalho, chamado “Gente Nossa”. Nele, a medição é uma das ações desenvolvidas. “Sabendo que o problema existe, é preciso tratar”, conscientiza-se o pedreiro, que está medicado e já assume costumes alimentares mais saudáveis. Palestra sobre hipertensão é a mais pedida Em Belo Horizonte, quando a obra pára, nem sempre é sinal de problema. Muitos canteiros têm aberto espaço para receber palestras sobre qualidade de vida com especialistas e médicos. Entre os temas mais pedidos pelas construtoras nessas campanhas, organizadas pelo Serviço Social da Indústria da Construção Civil de Minas Gerais (Seconci-MG), está a hipertensão. A doença, chamada de “assassina silenciosa”, só pode ser descoberta por meio da conscientização e do exame de medição de pressão arterial. A metodologia de atendimento dos trabalhadores é simples, conforme a supervisora do Serviço de Assistência Social do Seconci-MG, Sylvia Helena Macedo Costa. Para aproximar o serviço do trabalhador da construção civil, é preciso divulgação sobre a importância de medir a pressão periodicamente. Depois que a doença for diagnosticada, o paciente deve procurar um atendimento médico ambulatorial para consultar. O médico vai prescrever medicamentos para o controle da doença, dieta balanceada, com pouca gordura, especialmente sem aquelas de origem animal, e atividades físicas regulares. O Seconci-MG, braço social do Sindicato da Indústria da Construção Civil de Minas Gerais (Sinduscon-MG), viabiliza as palestras junto às construtoras com divulgação dos temas. A demanda também pode ser inversa. As empresas solicitam o tema, agendam o dia da palestra. A construtora adapta o local com cadeiras para o público e uma área em que os enfermeiros fazem a medição após a palestra. A explanação é feita por profissionais da área médica em aproximadamente uma hora. “Já fizemos palestras para um público que vai de 20 a 200 pessoas, de várias faixas etárias, tanto de áreas operacional quanto administrativa”, conta Sylvia Costa. Por fim, um material impresso com o resumo do que foi explicado é distribuído aos participantes. Neste primeiro semestre, o Seconci-MG organizou nove palestras e realizou 750 medições. Os trabalhadores que tiveram a doença detectada são encaminhados para o Senconci-MG para atendimento médico. Aqueles com disponibilidade são indicados para o grupo de hipertensos da instituição, para uma avaliação contínua junto a outros pacientes, todos trabalhadores da construção civil. Os integrantes do grupo se reúnem mensalmente para fazer medições e receber orientação de médicos, ou seja, acompanhamento e controle personalizados. Algumas construtoras, segundo Sylvia, oferecem as palestras periodicamente. É o caso da EPO Engenharia e Construtora Caparaó. “Há tendência de incluir esses encontros nos calendários das empresas, que vêem a ação como uma forma positiva de agir preventivamente”, diz. A conscientização, para ela, é uma ferramenta indispensável: “Muitos trabalhadores começam a mudar a forma de cuidar da saúde depois de participar das palestras”. Informação pode salvar vida Um dos integrantes do Seconci-MG nas palestras é o clínico geral Antônio Carlos Neves. Há quatro anos, ele vai até a linha de frente nos canteiros de obra para esclarecer centenas de trabalhadores sobre várias doenças, hábitos saudáveis, para preveni-las e coordenar os exames para detectá-las. “É um público carente dessas informações”, resume. O médico atenta para que as palestras agreguem informações de forma simplificada, assim, o assunto se torna compreensível a todos. A característica assintomática da hipertensão, de acordo com o médico, faz com que alguns pacientes não se importem com o fato de a pressão estar modificada. “Por não sentirem diferenças físicas, alguns acham que não é necessário fazer tratamento. As palestras esclarecem isso”, mostra Neves. Um dos casos que acompanhou o resultado da palestra foi mais além. Um dos trabalhadores fez a medição e foi constatado que ele era hipertenso. Já no ambulatório para fazer exames mais aprofundados, foi dectada uma segunda doença: sopro cardíaco que levou o paciente para a mesa de operação. O resultado foi positivo e, depois do susto e da recuperação, voltou à ativa. Outro participante desses eventos, mas na Construtora Caparaó, o pedreiro Cícero Alves dos Santos descobriu que é hipertenso. Ele encarou o tratamento e toma remédio regularmente antes de ir trabalhar na reforma do Cine Brasil, na Praça 7, Centro de Belo Horizonte. Em casa, ele afirma que a esposa, Marizete Alves dos Santos, é quem cuida das refeições. Ela, com quem é casado há 24 anos, também é hipertensa, e descobriu a enfermidade silenciosa antes do marido. Ele garante que ela faz o tratamento com remédio e caminhadas. Marizete segura o tempero da cozinha com pouco sal, um dos principais vilões da hipertensão. “Não comemos gorduras e damos preferência às verduras e legumes”, acrescenta Santos. O pedreiro tem dois filhos adultos e lembra-se do dia em que chegou em casa com a novidade. “Todo mundo veio pra cima de mim dizendo que eu precisava me cuidar. Hoje eles me cobram todo dia se eu já tomei o remédio”, narra orgulhoso do carinho familiar. Medir pressão regularmente também entrou para os hábitos do pedreiro, que consegue os medicamentos no posto de saúde sem custos. “Não me atrapalha em nada esses hábitos. Foi muito bom participar da palestra. A gente sabendo que tem o problema é preciso tratar”. Além das palestras sobre hipertensão, o Seconci-MG oferece outros 12 temas, entre eles, diabetes, tabagismo, alcoolismo, estresse, câncer de próstata e um assunto que volta a ser demandado pelas construtoras, a higiene pessoal.