Maior programa habitacional chega aos 10 anos com futuro incerto. Fim do programa pode aumentar o desemprego no setor
Restrições orçamentárias impostas pelo governo que travaram repasses ao Minha Casa Minha Vida têm causado preocupação em empresários do setor da construção. O programa, que acaba de completar dez anos, é considerado a maior iniciativa para habitação popular da história do Brasil.
Hoje, o MCMV oferece a famílias com renda de até R$ 9 mil, taxas de financiamento menores, além de subsídios que chegam a 90% do valor do imóvel. Ao longo da sua história, o programa já lançou mais de 5,5 milhões de casas e apartamentos, o que colaborou para reduzir o déficit habitacional brasileiro em 2,8% ao ano, segundo informações da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC).
O orçamento da União prevê, para 2019, R$4,8 bilhões, sendo R$3,9 bilhões destinados para pagar obras já contratadas na faixa 1 e R$900 milhões em subsídio para as outras faixas. Nos últimos meses, as construtoras estão enfrentando atrasos nos pagamentos, o que compromete a continuidade das obras. As pendências já somam R$ 450 milhões, de janeiro a março.
De acordo com o Sindicato da Indústria da Construção Civil em Minas Gerais (Sinduscon-MG), o programa representa 2/3 do mercado imobiliário brasileiro. Em Belo Horizonte e Nova Lima, 60% das vendas de unidades novas foram construídas com recursos do programa. “Esta é uma situação gravíssima, que gera descompasso no mercado e insegurança nas construtoras. E o problema é maior para os pequenos”, destaca o presidente do Sinduscon-MG, Geraldo Jardim Linhares Junior. Segundo ele, os grandes construtores ainda conseguem custear o valor do subsídio. Já os pequenos, não.
Em 2009, quando o Minha Casa Minha Vida foi lançado, a Faixa 1 respondia por 50% das unidades contratadas. No ápice do programa, em 2013, as unidades da Faixa 1 respondiam por 59% do total. O índice chegou a 4,5% em 2017. No ano passado, essa faixa respondeu por menos de 21% das unidades contratadas.
Mesmo nas faixas que atendem famílias com rendas maiores, as contratações caíram ao longo dos anos. O ápice nessas faixas ocorreu em 2013, quando foram contratadas 912.407 habitações e entregues 648.474. Em 2018, as contratações caíram para 527.115 e, as entregas de unidades habitacionais, para 163.647.
O MCMV também impacta diretamente a geração de empregos. Os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), referentes a fevereiro, demonstraram que Belo Horizonte teve um saldo positivo de 8.040 empregos, sendo a construção civil o setor responsável pela geração de mais vagas: 3.291, mais de 40% do total. “A construção das habitações entregues ao longo da existência do programa empregou 3,5 milhões de trabalhadores. O setor de incorporação imobiliária depende mais de 70% dos investimentos do MCMV e a queda nas contratações vai impactar diretamente na economia não somente do estado, mas nacional”, avalia Linhares Junior.
Impacto na população
Segundo uma pesquisa da Abrainc e da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em 2017 o Brasil registrou um déficit habitacional de 7,8 milhões de domicílios. O presidente do Sinduscon-MG alerta para a importância do Minha Casa Minha Vida para facilitar o acesso das famílias mais pobres à casa própria. “O programa ajuda essa parcela da população que não tem residência e injeta investimento na economia do País”, afirma.
Para André Sampaio, diretor da Neocasa, empresa que atua há 25 anos no mercado imobiliário mineiro, com expertise no MCMV, o setor da construção já está sentindo esse desaquecimento há dois anos e a falta de investimento nos programas habitacionais reduz ainda mais a confiança do empresário que atua neste seguimento. “Se não houver uma ação objetiva do governo federal, seja para reativar o programa, ou criar um similar, vai haver um desaquecimento significativo na economia do País. O setor da construção é o “termômetro da economia”. Se a construção civil está bem, o Brasil está bem”, pontua.
O empresário destaca que, na prática, a melhora do cenário na construção civil tem impacto em diversos outros campos da atividade econômica. “Os investimentos em obras impulsionam áreas importantes para o desenvolvimento urbano. A construção de mais moradias diminui o déficit habitacional, a ampliação do saneamento básico melhora as condições de saúde da população e a expansão da mobilidade urbana oferece praticidade ao cotidiano, trazendo qualidade de vida.”
Além disso, à medida que as pessoas voltam aos seus postos de trabalho, as famílias recuperam sua capacidade de consumo, o que faz o comércio enxergar melhoras nas vendas, aumentando também a demanda da indústria. E o governo também ganha. A cada R$ 100 investidos na construção, R$ 25 voltam para os cofres públicos em forma de imposto.