Setor negocia R$ 3 bi com o governo federal. A indústria da construção civil poderá ganhar um plano de apoio na próxima semana, com a injeção de cerca de R$ 3 bilhões, para evitar uma desaceleração mais acentuada do que a esperada pelo setor em 2009 decorrente da crise financeira internacional. Segundo o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Paulo Safady Simão, o segmento já previa redução do ritmo no próximo exercício com as empresas anunciando o adiamento dos investimentos. “É preciso se resguardar da possibilidade de retrações ainda piores.” “As conversas com o governo federal seguem para continuarmos a avaliar o setor. Certamente, haverá um planejamento para garantir a retaguarda, com recursos que podem partir do compulsório ou da própria Caixa Econômica Federal (CEF)”, avaliou. O pacote consistiria na disponibilidade de linhas mais baratas para as construtoras manterem os aportes sem utilizar o caixa, conforme o presidente da CBIC. O reforço viria das linhas de crédito dos próprios bancos para serem repassadas ao setor. Nesta semana, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, admitiu que o governo estaria acompanhando com mais atenção as condições de crédito para a construção civil. Ele acrescentou que, caso haja necessidade, mais recursos poderão ser liberados para o setor. Ouvidas pela reportagem do DIÁRIO DO COMÉRCIO, as construtoras mineiras informaram que manterão uma postura “oportunista” em relação à escassez de crédito para investimentos no mercado. As empresas esperam que após a tempestade que sacode o mercado financeiro ocorra adequação de custos de mão-de-obra e produção, além da oferta de produtos no mercado. Euforia – Segundo os representantes das empresas, mesmo com a revisão de lançamentos para 2009 ainda há demanda reprimida, sendo que nos dois últimos anos o setor vem de um crescimento “eufórico” que desencadeou a elevação, além do necessário, de preços de alguns insumos básicos, sobretudo o aço e o cimento, além dos valores dos terrenos e da mão-de-obra. As perspectivas de desaceleração do setor acarretaram, ainda, sondagens das indústrias siderúrgicas e concreteiras que fornecem para as construtoras do Estado. Elas começaram a “medir o pulso” da construção civil em relação à diminuição da produtividade nos próximos meses decorrente da escassez de recursos com a crise no mercado financeiro internacional. Conforme informações do Sindicato da Indústria da Construção no Estado de Minas Gerais (Sinduscon-MG), os produtores de matérias-primas começaram a realizar pesquisas com as empresas, sondando as estimativas. A retração do crescimento do setor, considerado o alicerce da economia nacional, também era prevista devido às fortes bases de comparação dos últimos dois anos. “O pacote de ajuda do governo federal tentará manter as projeções como estavam antes da crise”, ressaltou Simão. O setor já fala em engavetar os lançamentos e na revisão dos investimentos. Mesmo com a segurança que blinda o mercado imobiliário primário no país, partindo da formação do segmento por recursos do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) e do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) – com regras predefinidas e juros tabelados -, a expectativa é de redução nas vendas além do esperado. MARX FERNANDES Locação: sinais de retração Apesar de o setor de construção civil ainda não sentir as conseqüências da crise econômica mundial, as atividades das empresas de locação e venda de máquinas já dão sinais de desaquecimento. O ritmo das locações, que no início de outubro chegou a cair 15% frente ao mesmo período do ano anterior, pode registrar até 30% em 2009, segundo representantes do segmento. Na Mecan – empresa do grupo Orguel que vende equipamentos – já foi observada retração de 10% na demanda em outubro. No entanto, o diretor do empreendimento, Carlos Alberto Passos Villefort, este número pode não ser considerado um termômetro confiável para medir o desaquecimento da demanda, pois as negociações geralmente são demoradas e ainda podem ser revertidas. Na Locguel, que faz parte do mesmo grupo e que aluga equipamentos, já foi observada a mesma redução. Segundo o diretor, desde 2005 a empresa cresce 30% ao ano e a crise econômica mundial pode representar uma desaceleração do ritmo das atividades. “A tendência é de que nos próximos meses não sejam feitos grandes investimentos em função da escassez de crédito no mercado”, destacou. Atualmente, a empresa produz cerca de 1,5 mil toneladas de equipamentos por mês. Se o cenário de incertezas se mantiver até o início de 2009, a previsão é que a venda de máquinas sofra uma redução de 30% no próximo ano, movimento que deve ser acompanhado pela redução da produção no mesmo ritmo. A empresa emprega 650 funcionários diretamente, mas ainda não há previsão de cortes no quadro. Porém, os investimentos de R$ 15 milhões iniciados em maio deste ano serão mantidos. A previsão é que as obras sejam finalizadas até maio de 2009, com expansão de 40% na capacidade produtiva. “Vamos esperar para ver como o mercado irá se comportar. Não acredito que a crise irá se estenderá por muito tempo”, disse. De acordo com o diretor Comercial da Tradimaq, empresa localizada em Contagem, na Região Metropolitana de Minas Gerais (RMBH), a área que está sendo mais afetada é a de venda de equipamentos. A atividade está sofrendo com a carência de crédito no mercado, pois são máquinas que dependem diretamente de financiamentos para serem adquiridas. Readequações – Segundo o diretor-proprietário, André Luiz Cunha Melo, alguns clientes que haviam feito os pedidos não têm recursos para quitar os equipamentos. A Tradimaq, então, está tendo que estocar as máquinas e renegociar com os fabricantes, pois os negócios não estão sendo concretizados. Com as modificações no cenário econômico, as empresas de bens de capital estão promovendo uma readequação no planejamento e algumas já anunciaram férias coletivas. Para o empreendedor, ainda não é possível prever como serão os resultados neste ano frente aos de 2007. Antes da eclosão da crise era previsto um crescimento de 26% nos negócios, mas agora é esperado um incremento um pouco menor. “Como tivemos uma expansão muito grande entre janeiro e setembro deste ano, as conseqüências da crise não devem ter grande impacto ainda em 2008”, disse. CAMILA COUTINHO CEF deve criar nova linha de crédito Rio – A presidente da Caixa Econômica Federal (CEF), Maria Fernanda Ramos Coelho, ontem que o banco poderá criar uma linha nova de crédito para a construção civil ou modificar as linhas que já opera para o setor. De acordo com ela, o governo quer apoiar o setor da construção civil como “uma ação preventiva”. Com a crise internacional, os juros das operações de financiamento já estão subindo e, além de dificultar a compra da casa própria, também reduziu os planos de investimentos das construtoras. A CEF, garantiu a executiva, não alterou suas taxas de juro. A executiva deu as declarações à imprensa após participar de cerimônia de entrega das chaves de 140 habitações subsidiadas pelos governos federal, estadual e municipal na Cidade de Deus, zona Oeste da capital fluminense. Sobre os financiamentos da Caixa para a construção civil, ela disse que a instituição “continua operando de vento em popa”. A executiva informou que de janeiro a setembro a Caixa já financiou R$ 17,4 bilhões, o que representa 55% acima do crédito concedido no mesmo período do ano passado. “Estamos fazendo uma média de mais de R$ 100 milhões por dia”, disse Maria Fernanda. “Não sentimos nenhuma redução de demanda. O setor está operando muito bem”, declarou. Ela comentou que no Brasil o déficit habitacional é muito grande e a massa salarial está crescendo. Também argumentou que as obras do PAC ajudam o setor. A presidente da Caixa informou que as fontes de recursos da instituição para o crédito habitacional são a poupança, que já captou R$ 8,5 bilhões este ano, e o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), cujo orçamento é alocado no início do ano. Assim, a CEF não enfrenta dificuldade de obtenção de recursos para o financiamento imobiliário. “Não aumentamos as taxas de juros”, acrescentou. Segundo Maria Fernanda, a CEF está negociando a compra de carteiras de crédito com mais 20 instituições financeiras além das quatro de quem já comprou, no valor total de R$ 4,7 bilhões. Ela não deu o valor, nem ordem de grandeza para as carteiras de crédito que estão em negociação. O perfil das carteiras, tanto as já adquiridas, quanto as que estão em negociação, é de crédito consignado e para pequenas e médias empresas. O objetivo é dar liquidez ao mercado para que as instituições vendedoras emprestem mais. A presidente explicou que a Caixa não coloca nenhuma exigência de que os bancos vendedores voltem a emprestar. “Isso é com o compulsório”, disse, referindo-se à liberação de depósitos compulsórios pelo Banco Central aos bancos, medida sobre a qual o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já declarou que é feita para os bancos emprestarem. (AE)