Nice Silva Especial para o HOJE EM DIA Neste ano, o Governo Federal confirmou que seguirá com a política de fomento à habitação. Juntos, Caixa e Banco do Brasil vão liberar R$ 50 bilhões, 20% a mais do que no ano passado. A medida visa diminuir o déficit habitacional, cerca de oito milhões de moradias, e movimentar a construção civil, fonte garantida de empregos em tempos de crise anunciada. O incentivo à moradia própria mexe com os sonhos do brasileiro e com o mercado imobiliário. “Se o Governo realmente cumprir o que vem prometendo para a habitação, em seis meses começaremos a sentir os efeitos disso tanto para quem aluga como para quem compra”, avalia o presidente do Conselho Federal dos Corretores de Imóveis (Cofeci), João Teodoro da Silva. Nesse cenário, será possível até optar com mais tranquilidade entre comprar ou alugar um imóvel, segundo ele. Segundo afirmou o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, o Governo deve adotar novas medidas de estímulo à economia brasileira ao longo de 2009, especialmente para a construção civil e financiamentos habitacionais, bem como linhas de empréstimos operadas pelos bancos públicos como o BNDES, que poderão receber mais recursos. O dinheiro extra se originaria da maior arrecadação do FGTS e do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) no ano passado. A Caixa confirmou que o FGTS teve um aumento de arrecadação bruta de 16% em 2008, ante o resultado de 2007. Descontando-se os saques, o saldo líquido do FGTS ficou positivo em R$ 6,7 bilhões, resultado recorde. Num exemplo prático do esforço governamental, vigente a partir de janeiro deste ano, um trabalhador que ganha até R$ 2 mil terá taxa de 5% ao ano e 30 anos para pagar, e se o mesmo for cotista do FGTS esta taxa baixa para 4,5% ao ano, ou seja, 1% a menos que a taxa praticada no ano de 2008, que era de 6% a 6,5% para este perfil de financiamento. Associado a esse cenário, a perspectiva de estabilidade da economia também contribui para que se possa começar a pensar na mudança de perspectiva diante do sonho da casa própria. Afinal, com a inflação sob o rígido controle do Governo, já é possível até fazer a compra planejada do apartamento. O professor de Finanças, Paulo Vieira avalia que a taxa de ganho real (eliminada a inflação) para as aplicações financeiras menos sujeitas ao risco, como os fundos de renda fixa, que pagam em média 0,08% de rendimento ao mês e dão taxa anual aproximada de 10%, é considerado um bom ganho, inclusive se comparado ao ganho real conseguido em países de primeiro mundo. Segundo ele, quem tem a possibilidade de fazer poupança para adquirir um apartamento e pode custear as despesas de um aluguel, a locação pode ser indicada. “O problema é que o número de pessoas apertadas é maior do que o de folgadas para poder optar por esse comportamento”, observa. O analista pondera que a poupança revela-se estratégica também porque comprar um imóvel à vista é sempre mais vantajoso do que optar pelo financiamento. “Com o dinheiro na mão, é muito mais fácil negociar condições melhores na hora de comprar um imóvel”, constata. “Se uma pessoa conseguir separar R$ 100 mil e poupá-lo a juros de 10% ao ano (0,08% ao mês), terá, ao final de 10 anos, um valor de R$ 268 mil. Se o prazo for estendido para 20 anos, o rendimento passa de R$ 670 mil”, calcula. Para a maioria da população, ele admite, economizarpelo menos 10% do que ganha é uma tarefa quase impossível. Paulo Vieira constata que a poupança exige uma forte determinação de cada um. Por outro lado, ele avalia que a instabilidade econômica contribuiu decisivamente para a cultura da casa própria no Brasil. “Devido à imprevisibilidade da economia, as pessoas sempre sonharam em ter, pelo menos, um lugar para se abrigar com a família”, analisa. Com a economia brasileira demonstrando estabilidade desde o Plano Real, de 1998, o sonho de um ter um pouco mais de fôlego para planejar a compra começa a alterar a cultura da moradia. Ele recomenda que, diante da alternativa de alugar ou comprar uma casa para morar, o que deve prevalecer é o cálculo do custo e do benefício. “Nem sempre o melhor é comprar. Às vezes, a prestação do imóvel fica mais cara do que o aluguel”, avalia. Na perspectiva de mudança do cenário imobiliário, a médio e longo prazo, o mais recomendado é parar para refletir. “Prestações obedecem a contrato, aluguéis podem oscilar mais do que as prestações”, diz. Para o diretor da Caixa Imobiliária (Rede Netimóveis) e advogado especializado em mercado imobiliário, Kênio Pereira, é prematuro se falar em alteração significativa do mercado imobiliário no curto prazo. Para o advogado, os aluguéis (que subiram 15% em Belo Horizonte no ano passado) devem manter a mesma tendência, uma vez que ainda estão com preços defasados. Embora constate que não são suficientes para alterar em profundidade o problema da habitação brasileira, Kênio aprova as política do Governo Lula divulgadas neste ano para o setor. “A Caixa deve manter as boas condições de financiamento já oferecidas no ano passado, mas com maior incentivo: a diminuição da taxa de juros para a camada com renda de até R$ 2 mil e a elasticidade no prazo de pagamento. A Caixa pode fazer isso tendo em vista o volume recorde de depósitos na poupança, bem como o expressivo aumento de arrecadação bruta de FGTS em 2008, que foi 16% superior ao arrecadado em 2007”, ressalta. O especialista diz que a compra de um imóvel, o bem mais caro do mundo, segundo Kênio, continua sendo um privilégio. “A pessoa pode comprar se tiver capacidade de pagar”, resume. Ele também recomenda cautela diante das intermediações dos bancos: “Financiamento de 100% do imóvel é um altíssimo risco”. Ainda que nem sempre seja possível, o melhor, segundo o advogado, é poupar o suficiente para dar metade do valor do imóvel. A medida possibilita negociar direto com a construtora e fugir dos longos financiamentos com risco de inadimplência e perda de tudo o que já se pagou, além da casa própria.