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Mercado pede supertrabalhador

Assentar tijolos é apenas uma pequena parte das tarefas do dia-a-dia de trabalho de Rones da Silva Pereira. Desafiado pelo patrão, ele aprendeu a fazer cálculos matemáticos para não desperdiçar material na obra e a decifrar, sem a presença de um engenheiro, projetos estruturais, arquitetônicos, hidráulicos e elétricos da construção. Meses depois de se dedicar a um programa pesado de reciclagem profissional, o pedreiro, de 30 anos, conquistou uma vaga de subencarregado e viu o salário crescer 50%. Qualificação se transformou na palavra-chave da seleção rigorosa das empresas, aparentemente um contrasenso em pleno apagão de mão-de-obra no país. A novidade, contudo, é dolorosa para um universo de quase 3 milhões de desempregados só em seis das principais regiões metropolitanas do Brasil, num momento de queda recorde das taxas de desemprego. Há dois meses, a diarista Cláudia Martins da Costa, de 42 anos, entendeu o significado das mudanças no mercado de trabalho. Ela perdeu a chance de se candidatar a um sonhado emprego com a carteira assinada num escritório da capital mineira, que exigia conhecimentos de informática. Além da faxina, era necessário substituir a recepcionista ao computador em alguns períodos da jornada de trabalho. “Só estudei até a 7ª série, não sei nem ligar um computador. Agora, sinto a falta que o estudo faz e vou voltar à sala de aula”, afirma. Até mesmo nas funções de menor complexidade, seja na construção civil ou no setor de prestação de serviços, o empregado tem de saber lidar com a evolução tecnológica dos equipamentos e desempenhar tarefas adicionais à área específica em que se formou. O custo total da construção em que o subencarregado Rones Pereira está trabalhando, a qualidade do acabamento final e o destino correto do refugo, conforme as leis ambientais, também são problemas nos quais ele tem de se envolver. “Se o trabalhador não estiver qualificado, as portas se fecham para ele. Antes, eu não tinha nem visão do projeto de uma obra. Quero fazer o curso para encarregado e voltar a estudar”, diz Rones, que abandonou os estudos para trabalhar, ao completar a 5ª série do ensino fundamental. O patrão, Eduardo Henrique Moreira, garante que as empresas não têm outra saída senão investir na qualificação dos seus profissionais, para sobreviver num mercado de forte competição e cobrança do cliente. “Falta gente qualificada, principalmente a mão-de-obra de técnicos. Um mestre-de-obras pode ganhar até R$ 4 mil em construções de alto nível, com seu conhecimento”, afirma Moreira, vice-presidente da área de Materiais, Tecnologia e Meio Ambiente do Sindicato da Indústria da Construção Civil de Minas Gerais (Sinduscon-MG). Nas escolas do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) em Minas, 55 mil alunos freqüentaram 83 modalidades de cursos de qualificação e 70 cursos técnicos no ano passado. A concorrência chegou a três dezenas de candidatos por vaga, número que se compara ao vestibular dos cursos mais concorridos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), como o de medicina. Cerca de 70% dos alunos do Senai conseguiram emprego depois de obter o diploma, assegura Edmar Alcântara, gerente de Educação e Tecnologia da instituição. DESCOMPASSO “Boa parte das empresas já começa a contratar antes mesmo de o aluno concluir o curso e há casos em que elas pagam bolsa de estudos para garantir a contratação”, afirma Alcântara. Este ano, a previsão é atender 60 mil alunos. No ramo de serviços, a realidade é a mesma. Emerson Luiz de Castro, superintendente educacional do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial em Minas (Senac-MG), afirma que, em média, 80% dos que se formam na instituição são absorvidos nas empresas. “Flexibilizamos muito os requisitos para as pessoas aproveitarem os programas”, diz Castro. A maior dificuldade para os trabalhadores está no descompasso entre o perfil dos candidatos e as exigências para preenchimento das vagas. Na Grande BH, 58% dos desempregados – estimados em 276 mil no mês passado – sequer completaram o ensino médio, informa o economista Mário Rodarte, coordenador, pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), da Pesquisa de Emprego e Desemprego, feita junto à Fundação João Pinheiro (FJP) e Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese). “As políticas de qualificação que foram implementadas nos anos 90 teriam muito mais êxito agora, já que há crescimento de emprego para absorver os trabalhadores”, afirma. Para quem procura emprego, as agências do Sistema Nacional de Emprego (Sine) em todo o estado oferecerem cursos gratuitos, incluídos num plano de qualificação estadual, em que estão sendo investidos R$ 14,2 milhões este ano. Desafio é aumentar as vagas Redes estaduais de formação profissional, escolas agrotécnicas e centros federais de educação conseguem atender apenas 17% da demanda. E só 30% estão na rede pública Apesar dos avanços econômicos e sociais dos últimos anos, o Brasil ainda deixa muito a desejar nos quesitos educação e qualificação profissional do capital humano. Exemplos do atraso brasileiro: apenas 17% de quem procura por ensino profissional conseguem vaga nos núcleos estaduais de formação, escolas agrotécnicas, colégios técnicos vinculados a universidades e centros federais de educação tecnológica. E só 30% dos 800 mil jovens e adultos matriculados, o equivalente a 240 mil pessoas, estão na rede pública. Em Minas, a demanda reprimida chega a 75% do contigente de candidatos. Segundo o diretor de políticas da Secretaria de Educação Profissionalizante do Ministério da Educação (Setec/MEC), professor Luiz Caldas, a média nacional por vaga nos processos seletivos das escolas públicas de formação profissionalizante varia entre 25 e 30 concorrentes na área industrial. Para as licenciaturas, também oferecidas pelos institutos federais de educação, ciência e tecnologia, o número cai para 20 pessoas por posição, mas ainda é alto. Em 2014, a meta do MEC é oferecer 2 milhões de vagas – mas, para isso, 1,2 milhão precisam ser criadas. “Dessas, 400 mil têm de ser abertas em Minas, metade em nível técnico e a outra parte em graduações oferecidas pelos Cefets e demais unidades da rede federal”, afirma. Hoje, o estado conta apenas com 30 mil posições em educação profissional e 3 mil vagas de 3º grau vinculadas aos Cefets. As carteiras das universidades federais são também muito disputadas. Conforme o censo da educação superior, os últimos processos seletivos pesquisados em todos os estados do país ofereceram 125,3 mil vagas nas universidades federais para 1,13 milhão de inscritos. Em Minas, a concorrência foi ainda mais acirrada: 15 mil posições e 191,5 mil concorrentes. Atualmente, o apagão de mão-de-obra atinge, primeiramente, o corpo docente. Há somente 4,6 mil pessoas cursando licenciaturas e, até 2014, para haver professores suficientes, o número de matrículas precisa subir para 88 mil. Outra lacuna são as engenharias mais tradicionais, como elétrica e metal-mecânica. “A rede deve chegar a 45 mil posições em 2015. Hoje, são pouco mais de 7,5 mil”, acrescenta Caldas. CURSOS TECNOLÓGICOS Para suprir as deficiências, os cursos superiores tecnológicos são também uma aposta. Atualmente, eles abrangem 21 áreas – informática, automação, química (petroquímica), design, construção civil, comunicação, comércio, lazer e desenvolvimento social, artes, telecomunicações, saúde, turismo e hospitalidade, imagem pessoal, geomática, gestão, indústria (metalurgia), meio ambiente, transporte, biotecnologia, agropecuária, mineração e pesca, ainda muito pontuada pela necessidade de qualificação em nível básico – e possibilitam formação em tempo menor. “O problema não é a quantidade de áreas. Hoje, já atendemos a maioria, mas não com a escala devida”, acrescenta. Outro ponto fundamental das graudações tecnológicas que também passa por mudança é a forma de organização dos currículos, em transição para o modelo de eixos tecnológicos. “A concepção de áreas é muito fragmentada e os eixos dão mais amplitude à capacitação. Assim, conseguimos não perder o enfoque sob uma perspectiva mais generalista das profissões”, completa. Apesar de os currículos das capacitações hoje serem totalmente voltados para a necessidade dos arranjos produtivos locais, o diretor não acredita que os profissionais formados sejam tão especializados a ponto de comprometer seu aproveitamento pelo mercado. “O conceito de especialização, nesse caso, não vai ao encontro do estreitamento, mas do foco no setor em que se pretende atuar”, diferencia. OPORTUNIDADES DE APRENDIZAGEM Senac-MG Cursos técnicos em informática, enfermagem, segurança no trabalho, ótica, culinária, hotelaria; capacitação nas áreas de saúde e beleza SENAI-MG 86 cursos de qualificação direcionados à indústria SINDUSCON/SECONCI/FUMEC Cursos para conclusão do ensino fundamental e requalificação de pedreiros de acabamento, eletricista e bombeiro predial, entre outros SEDESE/FAT Cursos gratuitos em diversas áreas com duração não inferior a 120 horas, inclusão digital e supletivos do ensino regular VAGAS MAIS DIFÍCEIS DE PREENCHER Marceneiro, costureira, serralheiro, polidor de metais, operador de retroescavadeira, montador, soldador, técnico de manutenção eletrônica, cozinheiro, engenheiro, geólogo Fonte: Agências do Sine-MG/empresas, Sesi e Senai