Pesquisadores brasileiros conseguem fabricar vidro a partir dos resíduos provenientes da produção de rochas ornamentais, que agridem o meio ambiente se descartados Gisela Cabral Brasília – A construção civil acaba de ganhar mais um aliado ambientalmente correto. Produzido em laboratório a partir do resíduo que provém do corte de rochas ornamentais, como o mármore e o granito, o vidro ecológico surge como uma alternativa viável para a indústria, pois tem a mesma qualidade do comum. Usado na fabricação de janelas, o produto impede totalmente a passagem da radiação ultravioleta (UV) – causadora do câncer de pele – e não permite o aumento da temperatura no interior de uma casa, por exemplo. Além disso, pode ser empregado na produção de potes, frascos, garrafas e lâmpadas. A ideia da pesquisadora Michelle Babisk foi colocada em prática depois de vários testes feitos com auxílio do Instituto Nacional de Tecnologia (INT), órgão vinculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). Nascida em Cachoeiro do Itapemirim (ES), Michele tinha conhecimento da grande quantidade de resíduos provenientes da indústria de rochas na cidade. “É um pó fino capaz também de desencadear diversas doenças. E, se jogado na água, pode causar a morte de peixes”, explica a responsável pelo estudo. Segundo ela, 60% das empresas que trabalham com rochas ornamentais estão situadas no Sul do Espírito Santo. O vidro ecológico é do tipo sodo-cálcico, ou seja, que contém em sua composição sódio e cálcio. Existem ainda os de tipo cristal e boro-silicato. O tecnólogo do INT e orientador da pesquisa de Michelle, José Carlos Rocha, aponta que outro benefício trazido pelo produto é a economia de areia. “Para a produção do vidro ecológico, usamos 1 quilo de areia para cada quilo de resíduos. No caso do vidro normal, a exigência de areia é bem maior, chegando ao dobro”, explica ele, lembrando que o INT também contou com o apoio do Instituto Militar de Engenharia (IME). A extração de areia, grande parte das vezes feita de forma ilegal, é uma das principais responsáveis pelos impactos negativos surgidos da produção de vidro. O material obtido das pesquisas apresenta uma coloração verde, devido ao óxido ferroso, presente nos resíduos das rochas. Essa característica leva a outros usos. “Percebemos que a composição química dele trouxe benefícios para o armazenamento de alguns líquidos, como a cerveja, sem alterar o sabor e a coloração”, explica Rocha. Por esse motivo, o produto já chamou a atenção da indústria de bebidas. Antes, porém, ele precisa ser patenteado. “Nas próximas semanas, o trabalho será apresentado na 11ª Conferência Internacional de Materiais Avançados (Icam). O evento já foi sediado por diversos países, como México e China, e tem o objetivo de apresentar novidades na área de materiais”, completa. ARGAMASSA Resíduos da indústria de rochas ornamentais podem servir para outras finalidades. Exemplos disso são pesquisas que reaproveitaram o pó para a produção de argamassa. O material composto por cimento, água e areia é usado para fazer revestimentos e trabalhos de alvenaria. Parceira do INT, a empresa Argamil inaugurou, no ano passado, em Santo Antônio de Pádua (RJ), a primeira fábrica a utilizar essa tecnologia. De acordo com Djalma Brandão, superintendente da empresa, a fábrica tem alta capacidade de produção e usa como base o pó fino proveniente da indústria de pedras. “Também usamos areia artificial, feita a partir de resíduos de pedras, como a brita. Processamos esse material até ele se tornar um pó bem fino. Com isso, evitamos a extração inadequada”, afirma. Segundo Brandão, a qualidade da argamassa ecológica é a mesma da comum, além de o preço ser praticamente o mesmo. A companhia ganha ainda por poder oferecer um produto diferenciado e ecologicamente correto. José Carlos Rocha diz que a adoção de materiais recicláveis é cada vez mais necessária, para garantir a sustentabilidade das futuras gerações. “São alternativas para que o planeta não se torne uma grande lixeira”, finaliza.