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Artigo: STF estabelece retomada de ações de reintegração de posse suspensas durante a pandemia

EMENTA: Decisão retoma o regime legal para as ocupações individuais e cria regime de transição para ocupações coletivas consolidadas durante a pandemia de COVID-19

O Ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), em recente decisão monocrática, determinou a criação do chamado “Regime de transição quanto às ocupações coletivas” para a retomada da execução das decisões suspensas por esta ação.

A decisão foi proferida no contexto da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 828, na qual restaram suspensas ordens de remoção e despejos de áreas coletivas habitadas antes da pandemia.

A decisão, proferida em junho de 2021, suspendia tais ordens por seis meses, levando em consideração os efeitos sociais e econômicos causados pela crise da COVID-19, sendo que a decisão acabou sendo prorrogada por duas vezes, vencendo no dia 31 de outubro de 2022.

Apresentado novo pedido de prorrogação da suspensão, formulado por partidos políticos e movimentos sociais, Barroso negou. Mas criou o citado “Regime de transição”, determinando a criação imediata de Comissões de Conflitos Fundiários nos Tribunais de Justiça Estaduais e Tribunais Regionais Federais, tendo como referência o modelo adotado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.

decisão noticiada pela Revista Veja trouxe preocupações para muitas pessoas que, a princípio, entenderam que essa decisão poderia relativizar o direito à propriedade privada.

É importante esclarecer que o art. 5º, da Constituição Federal de 1988, preceitua como direitos fundamentais o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, estabelecendo em seus incisos os termos a serem observados, dentre eles, a função social da propriedade.

Esses pilares constitucionais fazem com que toda a legislação infraconstitucional (inclusive, o rito processual de uma ação de reintegração de posse ou de uma ação de despejo) deva ser aplicada em respeito, em igual medida, a tais direitos; sendo certo, contudo, que a complexidade da vida em sociedade traz inúmeros desafios de julgamento no caso concreto.

Em razão disso, a decisão do Ministro Barroso, exaustivamente fundamentada nos efeitos provocados pela crise sanitária da COVID-19, procurou encontrar uma solução que permitisse a retomada das desocupações e desse maior eficiência ao cumprimento dos mandados de reintegração de posse e despejo coletivos, os quais apresentam uma complexidade maior quanto ao confronto dos preceitos acima indicados.

A decisão, inclusive, deixa claro que não ficou deferida a prorrogação da suspensão, mas determinou um regime de transição a ser adotado após quase um ano e meio de proibição das desocupações. 

Neste sentido, inclusive, a decisão deixa expresso:

“(…) Retomada do regime legal para desocupação de imóvel urbano em ações de despejo. A determinação de desocupação de imóvel urbano em ações de despejo reguladas pela Lei do Inquilinato não enfrenta as mesmas complexidades do desfazimento de ocupações coletivas que não possuem base contratual. Por isso, não se mostra necessário aqui um regime de transição.”

Ou seja, na leitura do Conselho Jurídico do Sinduscon-MG (Conjur-MG), o criado regime de transição NÃO SE APLICA às demais ações de reintegração nem aos demais casos de desocupação individual regulados pela Lei do Inquilinato, casos em que esta lei, tal como vigente, volta a ser aplicada integralmente.

Neste sentido, destaca-se o seguinte trecho da decisão que esclarece a competência das referidas Comissões:

(…) 5. A Comissão de Conflitos Fundiários terá a atribuição de realizar visitas técnicas, audiências de mediação e, principalmente, propor a estratégia de retomada da execução de decisões suspensas pela presente ação, de maneira gradual e escalonada. As comissões poderão se valer da consultoria e capacitação do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, e funcionarão, nos casos judicializados, como órgão auxiliar do juiz da causa, que permanece com a competência decisória. (…)

É de extrema importância a interpretação correta da decisão e o estrito cumprimento da lei, em especial, dos preceitos constitucionais para evidenciarmos que ela propõe uma solução para uma situação excepcional. A pandemia lamentavelmente provocou uma situação grave e atípica, incomparável às demais dificuldades da nossa sociedade.

A advertência é de extrema relevância, pois, afinal, como o próprio Ministro Barroso disse em sua decisão “(…) embora possa caber ao Tribunal a proteção da vida e da saúde durante a pandemia, não cabe a ele traçar a política fundiária e habitacional do país“.

Assim, entendemos que a decisão não ameaça o direito à propriedade privada, tendo sido feita, pelo Ministro, a devida ressalva quanto à retomada do regime legal para as desocupações individuais.


DIANA NACUR, Presidente do Conselho Jurídico do Sinduscon-MG (Conjur-MG)